sábado, 27 de agosto de 2011

O que é que o Cacém tem? Carne no pão e no prato como ninguém

Não pense que vai à toa a um dos dormitórios de Lisboa. Há pregos e bitoques que são um sonho para quem está acordado



A feijoada já acabou. Não temos pena nenhuma, apesar do olhar de lamento do empregado quando anuncia a novidade. Mas alguém no seu perfeito juízo vem a um restaurante cujo nome tenha apelido "Prego" ou "Bitoque" pedir um pato confitado com molho de laranja ou outros rodriguinhos que o valham? Pois não. Nem reclamar o prato do dia, uma alternativa permanente.


Respondendo à pergunta do título, é difícil reunir bons argumentos à partida. Uma malha de prédios incaracterística, uma fauna flutuante, trânsito quanto baste, obras que se arrastam com o dedo de Santa Engrácia. Apenas um chavão de um postal turístico desejoso de crescer em número de predicados. E para isso ninguém melhor que um local para nos conduzir ao longo de uma semana de almoços que provam que a freguesia do concelho de Sintra tem uma enorme vantagem em relação à capital: mesa boa e barata.Talvez seja difícil convencer um alfacinha legítimo a aventurar-se num subúrbio de apartamentos com marquises com o mero chamariz de um almoço. Mas a verdade é que esta terra que dá um baile ao rótulo fácil de dormitório é o epicentro da gula dos carnívoros e um perfeito atentado à dieta dos vegetariano. Um condomínio privado em matéria de carne, com honras de prego e de bitoque. "Vai ser no pão ou no prato?" O convite é dirigido a barrigas honestas que não se importam de sujar os dedos ou lambuzar o pão nos molhos generosos. Que gostam de bifes que sabem a bifes, saboreados em ambientes sem nove horas. Para os espíritos gourmet, não vale a pena a deslocação ao Campo Futebol Atlético Clube do Cacém, a não ser que goste de assistir aos treinos. O Rui dos Pregos, Cervejaria e Marisqueira, é uma pequena mina do serviço simples, rápido e simpático. Um paraíso de entradas e mariscos para os fãs de petiscos como salada de polvo e de orelha, pica-pau, berbigão, navalheiras, canilhas ou burriés, e uma deixa irrecusável para provar o bom do prego.Na modalidade pão, a carne extravasa os limites da bola levemente torrada e estaladiça. No prato, é outra aventura para os exploradores de garfo e faca. É natural que não descubra nenhum vestígio do exemplar da vazia à primeira vista. A carne está bem camuflada pela pilha de batatas fritas, pelo ovo, pela rodela de limão, pelas azeitonas e pelos pickles, mas quando começa a busca pelo fino bife sem nervuras percebe que ele ocupa toda a dimensão do fundo do recipiente e arredores. Some-se alho com fartura (existe também a versão extra-alho), esmagado e ainda com vestígios de casca - o que poderá incomodar alguns comensais, mas, apostamos, o sucesso passa por aqui. Apesar da hora tardia, ainda há muito boa boca a almoçar na sala interior. A esplanada é uma opção a ter em conta para fumadores. Diz quem sabe que as longas filas, em especial ao fim-de-semana, são uma constante, e não vale a pena tentar marcar. Há que saber esperar pacientemente pela sua vez; a demora compensa. A escassos 300 metros de distância encontra outro estabelecimento do grupo onde não corre o risco de perecer esfaimado. Ambos os espaços estão abertos todos os dias.POR ESTE MOLHO ACIMA Tenros como manteiga e sem vestígio de gorduras? Acabou de chegar ao Solar do Bitoque. O espaço, simples e descontraído, com ar de snack-bar, não deve nada ao luxo, e está longe de ter o nome inscrito num guia de turismo de habitação. O prato mais importante da casa só teria a perder com salamaleques. Sobretudo quando chegar à mesa nas suas dimensões avantajadas e o cliente compreender que é muito difícil não salpicar a toalha de papel com o apetitoso molho escuro. Ainda bem que inventaram os guardanapos.Também há omeletas, hambúrgueres e pratos do dia rotativos pela módica quantia de 4,5€, do empadão de vitela ao arroz de pato, bem como uma ementa fixa para quem está farto de proteínas e hidratos de carbono em alta escala. O prego é outra das iguarias na ementa, mas menos generoso que na casa anterior. O nome não defrauda: é nos bitoques que a casa dá cartas, com a vantagem de trazer as batatas à parte, o que dá margem de manobra com os talheres. No final de uma semana sem sinal de espinhas, eis-nos finalmente chegados ao Dom Prego. Somos recebidos pelo som do martelo, sinal indiscutível de que a carninha que em breve viaja até ao prato e ao pão foi devidamente espalmada e não reencaminhará nenhum cliente para o dentista. O cenário não difere muito dos anteriores. O alho volta a vestir-se com a sua casca e as dimensões da carne desafiam os estômagos de passarinho. Já o molho, mais claro, cuja prova devolve uma combinação de manteiga, vinho e cerveja, é de chorar pelo regresso a esta bela localidade.

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